ADVOGADO PODE SER EMPRESÁRIO? ADVOGAR COMO PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA, QUAL É A DIFERENÇA?
Bem, esta época de quarentena, apesar de nos deixar um pouco melancólicos, saudosos e por muitas vezes entediados, tem lá suas vantagens, uma dela é nos dar um pouco mais de tempo para refletirmos sobre o “importante e não urgente” da nossa vida.
Como advogada com mais de 20 anos de exercício da advocacia, tenho certeza de que muitos colegas, principalmente aqueles que trabalham sozinhos ou com pequenas estruturas, mal tem tempo de dar conta de todas as atribuições e compromissos jurídicos e judiciais, com os clientes e processos, deixando para pensar quem sabe um dia, quando tiverem um pouco de tempo, na estrutura, administração e organização do escritório.
Talvez esta época de quarentena, nos forneça o tempo que precisamos para refletir um pouco sobre estes assuntos…
Saímos da faculdade, focados em passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, queremos advogar, abrir nosso escritório, conquistar clientes e sucesso, mas com raras exceções, sem o menor preparo para administrar e organizar um escritório, para sermos empreendedores, e assim na maioria das vezes o escritório vai caminhando por tentativa e erro.
O número da OAB já nos permite a advogar e em nossa imensa maioria, salvo quanto optamos por trabalhar para outros advogados, passamos a advogar como pessoas físicas, prestadores de serviços, autônomos.
Mas será que essa é a única forma de trabalhar como advogado? Como autônomo?
Alguns me dirão, claro que não! Há a figura da sociedade de advogados!
É verdade!
Há alguns anos, só existiam duas formas de advogar: Como pessoa física (advogado autônomo) ou como participantes de uma sociedade de advogados, pois o Estatuto da Advocacia (Lei 8906/94) somente previa em seu artigo 15º que os advogados poderiam se reunir em sociedade civil de prestações de serviços de advocacia.
Assim ou o advogado atuava como autônomo ou precisava se associar a outro advogado para criar uma sociedade de advogados, criando para esta sociedade um contrato social, registrado na OAB do local da sede do escritório, e passando a pagar taxas sobre esta sociedade de advogados.
E qual seria a vantagem e desvantagem de atuar como autônomo ou através de empresa (aqui como uma sociedade de advogados)?
Vantagem em ser uma sociedade de advogados: ser uma empresa, e como tal ter uma tributação diferenciada e menor do que a que é aplicada à pessoa física, participar do simples nacional, poder atuar como prestador de serviços para empresas que exigem este tipo de contratação;
Desvantagem: se de fato você não tem um sócio e toca seu escritório sozinho, a desvantagem ou incomodo era conseguir algum colega advogado que concordasse em participar da sociedade apenas de forma fictícia para a criação da sociedade de advogados.
Mas se o advogado trabalha sozinho, como alcançar as vantagens acima, especialmente em relação a tributação?
No mundo empresarial, é fato que é que em 2008, a Lei complementar 128/08 criou a figura da MEI – Micro Empresa Individual, permitindo que a pessoa física no exercício de algumas atividades, constituísse uma empresa sem ter sócios, de forma simples e descomplicada.
Entretanto, isso não ajudou aos advogados, pois por absoluta falta de previsão legal, os advogados não foram contemplados na lei, isso porque serviços advocatícios não constaram na relação de atividades permitidas para registro como Microempreendedor Individual.
Assim mesmo com a criação das MEIs os advogados que atuavam sozinhos continuaram a exercer a atividade como pessoa física, trabalhador autônomo.
Nova esperança na legislação: Em 2011, foi criada a figura da EIRELI, ou seja, foi criada a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, que previu em seu texto que esta modalidade poderia ser criada para empresas de prestação de serviços de qualquer natureza.
Embora a EIRELI tenha sido criada para beneficiar os empresários individuais, a lei determinou que para que fossem constituídas, deveria ser integralizado um capital no valor equivalente a 100 vezes o salário mínimo, e esta regra acabou por inviabilizar a doação desta modalidade por muitos empresários que não tinham este patrimônio para disponibilizar, deixando os advogados autônomos e pequenos escritórios sem esta possibilidade.
Além disso, para os advogados, mesmo com a criação da EIRELI em 2011, estes continuaram impedidos de constituírem uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, já que o Estatuto do Advogado não previa a figura da empresa unipessoal.
Após muita pressão por parte dos advogados autônomos, em 2016, foi criada pela Lei 13.247/2016, a figura da Sociedade Unipessoal de Advogado, alterando o artigo 15 do Estatuto dos Advogados.
A partir desta lei tornou-se possível passar do exercício do advogado autônomo para o advogado empresário sem que seja necessário a constituição de uma sociedade de fato.
A criação da sociedade unipessoal da advocacia passou a permitir que o advogado passasse a contribuir de uma forma mais econômica com o fisco, já que:
A sociedade unipessoal de advocacia, pode aderir ao simples nacional, passando a contribuir com alíquotas de 4,5% a 16,85% dependendo do faturamento, ao invés da contribuição de 7,5% a 27,5% mais o ISS.
Ressalta-se por oportuno que no ramo empresarial, recentemente foi criada a figura da sociedade unipessoal, permitindo que o empresário individual crie uma empresa unipessoal com responsabilidade limitada, isso atendeu ao clamor de muitos empresários já que para ter a responsabilidade limitada era necessário constituir uma sociedade com mais de um sócio ou constituir uma EIRELI, que necessita que seja integralizado pelo empresário o valor equivalente a 100 salários mínimos.
E quanto aos advogados é possível constituir uma empresa com responsabilidade limitada?
Em função das determinações contidas no Estatuto do Advogado, a responsabilidade do advogado sócio será sempre subsidiária e ilimitada, de acordo com o que dispõe o artigo 17 do EA, bem como do artigo 2º inciso VII, do provimento 170/2016.
Assim embora na legislação pátria exista uma tendência de limitar a responsabilidade do empresário, separando de fato o patrimônio da empresa (ainda que unipessoal) do patrimônio do empresário, salvo é claro nos casos de desconsideração da personalidade jurídica pelo juiz, é fato que para os advogados havendo apuração de responsabilidade pelo ato praticado o advogado seja ele sócio da sociedade simples seja ele uma sociedade unipessoal responderá de forma ilimitada, inclusive através do seu patrimônio pessoal.
Glaucia Bueno Quirino
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