Reajustes nos planos de saúde – Quais são os direitos garantidos ao consumidor?
Nos últimos meses temos recebido inúmeras consultas de consumidores sobre aumentos dos seus planos de saúde. Algumas destas consultas inclusive têm dado origem a ações judiciais questionando os aumentos aplicados as referidas mensalidades.
Assim, tendo em vista estas dúvidas dos consumidores em relação aos reajustes dos convênios médicos optei por escrever em poucas palavras quais são os possíveis reajustes e quais poderão ser questionados na justiça.
Hoje em dia temos cerca de 150 milhões de brasileiros sem planos de saúde e cerca de 50 milhões com plano de saúde, sendo que destes 19 milhões somente no estado de São Paulo.
Cabe ressaltar que 65% destes planos são planos de saúde empresariais ou coletivos, entretanto há 12 anos os planos de saúde são os campeões de reclamações segundo o IDEC.
Os planos de saúde podem ser divididos da seguinte forma:
1) pelas coberturas contratadas:
a) ambulatorial;
b) hospitalar;
c) hospitalar, obstetrícia e odontológica.
d) pela conjunção destas modalidades.
OBS: O artigo 10 da lei 9.656/98 traz as referências básicas para a cobertura mínima obrigatória dos planos privados.
2) Quanto à natureza da contratação:
a) planos de saúde individual/familiar. Contrato feito diretamente com a operadora do plano de saúde;
b) planos de saúde coletivos. Contrato feito através das empregadoras e por adesão à associação ou sindicatos.
Os reajustes podem normalmente se encaixam em três categorias:
Os reajustes anuais, os reajustes pela mudança de faixa etária e os reajustes pela sinistralidade.
Nos planos individuais, os reajustes anuais deverão ser aprovados pela ANS (contratos novos e antigos – anteriores 31/12/1998);
O cancelamento do contrato pela operadora somente poderá ocorrer com atraso superior à 60 dias com notificação até o 50º dia de atraso;
Nos planos coletivos: Os reajustes anuais não precisam ser autorizados pela ANS previamente, e devem ser negociados entre a operadora do plano de saúde e do contratante.
Outro aspecto: O envelhecimento dos beneficiários dos planos de saúde e o aumento por mudança de faixa etária.
Hoje a expectativa de vida do brasileiro é de 75,1 anos segundo pesquisa do IBGE de 2013.
– 11,4% dos beneficiários dos planos de saúde são idosos.
– 4,7% tem mais de 80 anos;
– 7,1% tem entre 70 e 79 anos;
– 12,1% tem entre 60 e 69 anos.
Estatuto do idoso – lei 10.741/2003
O Estatuto do Idoso (lei 10741/03), em seu artigo 15, parágrafo 3º, veda a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade, assim, restou pacífico que os convênios médicos não podem aumentar o convenio por faixa etária, a partir dos 60 anos dos beneficiários.
Por sua vez, o aumento por faixa etária foi regulamentado pela Resolução nº 63 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que definiu os limites a serem respeitados para a adoção de preço por faixa etária nos planos privados de saúde contratados a partir de 2004.
Tal norma definiu que o reajuste máximo por mudança de faixa etária que o consumidor pode sofrer, no total, é de 500%, sendo que a variação acumulada entre a sétima e a décima faixa não poderá ser superior à variação entre a primeira e sétima faixas.
Ressalta-se que nos casos de plano antigo os reajustes por idade para serem aplicados de forma legal, deverão estar previstos no contrato firmado com o consumidor de forma clara e transparente e desde que referidos reajustes não se caracterizarem como desarrazoados ou aleatórios e que possam onerar excessivamente o consumidor.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, em recente julgado, já declarou entendimento sobre a necessidade de anulação da cláusula de reajuste que não observa os índices estipulados pela a ANS:
“SEGURO. PLANO DE SAÚDE. CLÁUSULA DE REAJUSTE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA, RELATIVA A BENEFICIÁRIA IDOSA. ENTENDIMENTO FIXADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO, NO SENTIDO DE QUE O REAJUSTE DE PREÇO EM RAZÃO DA ALTERAÇÃO DE FAIXA ETÁRIA NÃO CONFIGURA, POR SI SÓ, PREVISÃO ILEGAL, AINDA QUE ATINJA O BENEFICIÁRIO IDOSO (REsp Nº 1.568.244/RJ). NULIDADE DA DISPOSIÇÃO CONTRATUAL QUE SE VERIFICA, MAS POR RAZÃO DISTINTA. CLÁUSULA DE REAJUSTE OBSCURA. FIXAÇÃO DE PERCENTUAL COM BASE EM US (UNIDADE DE SERVIÇO). INDETERMINAÇÃO. DÚVIDA QUE DEVE SER INTERPRETADA A FAVOR DO CONSUMIDOR. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 46 E 47 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NULIDADE RECONHECIDA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, CONTUDO, QUE SE LIMITAM AOS VALORES PAGOS APÓS O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRESUNÇÃO DE CONCORDÂNCIA DA AUTORA COM OS VALORES ANTERIORES. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1004327-35.2018.8.26.0100; Relator (a): Vito Guglielmi; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 14ª Vara Cível; Data do Julgamento: 02/05/2019; Data de Registro: 02/05/2019)”
Em recente julgamento o STJ determinou que o aumento por faixa etária somente será considerado legal se referido reajuste tiver uma previsão contratual expressa, se observar os percentuais previstos pela ANS, e se referidos reajustes não se caracterizarem como desarrazoados ou aleatórios e que possam onerar excessivamente o consumidor.
1. A variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes, sob pena de não ser aplicada (arts. 15, caput, e 16, IV, da Lei nº 9.656/1998).
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4. Para que as contraprestações financeiras dos idosos não ficassem extremamente dispendiosas, o ordenamento jurídico pátrio acolheu o princípio da solidariedade intergeracional, a forçar que os de mais tenra idade suportassem parte dos custos gerados pelos mais velhos, originando, assim, subsídios cruzados (mecanismo do community rating modificado).
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6. A norma do art. 15, § 3º, da Lei nº 10.741/2003, que veda “a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”, apenas inibe o reajuste que consubstanciar discriminação desproporcional ao idoso, ou seja, aquele sem pertinência alguma com o incremento do risco assistencial acobertado pelo contrato.
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7. Para evitar abusividades (Súmula nº 469/STJ) nos reajustes das contraprestações pecuniárias dos planos de saúde, alguns parâmetros devem ser observados, tais como (i) a expressa previsão contratual; (ii) não serem aplicados índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o consumidor, em manifesto confronto com a equidade e as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da especial proteção ao idoso, dado que aumentos excessivamente elevados, sobretudo para esta última categoria, poderão, de forma discriminatória, impossibilitar a sua permanência no plano; e (iii) respeito às normas expedidas pelos órgãos governamentais: a) No tocante aos contratos antigos e não adaptados, isto é, aos seguros e planos de saúde firmados antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656/1998, deve-se seguir o que consta no contrato, respeitadas, quanto à abusividade dos percentuais de aumento, as normas da legislação consumerista e, quanto à validade formal da cláusula, as diretrizes da Súmula Normativa nº 3/2001 da ANS.
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8. A abusividade dos aumentos das mensalidades de plano de saúde por inserção do usuário em nova faixa de risco, sobretudo de participantes idosos, deverá ser aferida em cada caso concreto. Tal reajuste será adequado e razoável sempre que o percentual de majoração for justificado atuarialmente, a permitir a continuidade contratual tanto de jovens quanto de idosos, bem como a sobrevivência do próprio fundo mútuo e da operadora, que visa comumente o lucro, o qual não pode ser predatório, haja vista a natureza da atividade econômica explorada: serviço público impróprio ou atividade privada regulamentada, complementar, no caso, ao Serviço Único de Saúde (SUS), de responsabilidade do Estado.
9. Se for reconhecida a abusividade do aumento praticado pela operadora de plano de saúde em virtude da alteração de faixa etária do usuário, para não haver desequilíbrio contratual, faz-se necessária, nos termos do art. 51, § 2º, do CDC, a apuração de percentual adequado e razoável de majoração da mensalidade em virtude da inserção do consumidor na nova faixa de risco, o que deverá ser feito por meio de cálculos atuariais na fase de cumprimento de sentença.
…
10. TESE para os fins do art. 1.040 do CPC/2015: O reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual, (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores e (iii) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.
Assim até os 59 anos de idade pode haver aumento por mudança de faixa etária (aumento por idade) desde que este aumento esteja expressamente previsto no contrato e desde que este aumento seja razoável e não onere excessivamente o consumidor.
Nestes casos quando o aumento se mostrar excessivo a questão poderá ser levada para discussão na justiça!
Reajuste abusivo: sinistralidade: artigo 35 da lei dos planos de saúde.
Por fim temos os aumentos em virtude da sinistralidade. O reajuste em virtude da sinistralidade consiste no aumento da mensalidade sob o argumento de que o paciente (contrato individual) ou aquele grupo de pacientes de determinado plano coletivo usou/usaram demasiadamente o plano de saúde de forma a justificar o reajuste da mensalidade pela operadora de saúde.
Entretanto estes reajustes, tem sido considerados ilegais pelos Tribunais de Justiça, em especial pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, uma vez que estes reajustes ferem as determinações da ANS e do Código de Defesa do Consumidor, já que impõe ao consumidor aumentos com base em tabelas de custos e planilhas incompreensíveis, autorizando as operadoras de planos de saúde a aplicar os reajustes que entendem devidos.
“Ação civil pública Limitação dos efeitos da sentença Descabimento Efeitos “erga omnes” Jurisprudência Litispendência inocorrente Aplicabilidade do CDC Reajuste por aumento de sinistralidade Impossibilidade Cláusula que não é clara Contrato de adesão Prescrição inocorrente Compensação de valores Inadmissibilidade Parcial procedência confirmada Apelo desprovido.” (TJSP, 6ª Câmara de Direito Privado, Apelação nº 0216448-75.2011.8.26.0100, rel. Fortes Barbosa, j. 18 de abril de 2013), grifo nosso.
“APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DE MENSALIDADE EM RAZÃO DA SINISTRALIDADE. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO SIMPLES. PRESCRIÇÃO TRIENAL. REAJUSTE ANUAL CONFORME O CONTRATADO. POSSIBILIDADE. (…)
REAJUSTE POR SINISTRALIDADE – A prática de reajustes com base na planilha de custos e desempenho, ou seja, na sinistralidade, vai de encontro às disposições do Código de Defesa do Consumidor, mormente porque essa condição, além de impedir o conveniado deter, no ato da contratação, a noção exata de quais serão os seus ônus, também possibilita a manipulação dos dados pela operadora, de modo a forçar a majoração artificial de preços, em clara ofensa ao artigo 51, inciso X e § 1º, e incisos I e II, do CDC.” (TJRS, 6ª Câmara de Cível Comarca de Três Passos, Apelação nº 70056483696, rel. Niwton Carpes da Silva, j. 24 de outubro de 2013), grifo nosso.
Cabe aqui destacar que a sinistralidade nada mais é que o efetivo uso do produto contratado pelo beneficiário. Aumentar-se o preço a ser pago pelo efetivo uso do plano de saúde fere os motivos que levaram à própria contratação e consiste em verdadeira burla aos riscos próprios do negócio, a que se obrigou a seguradora.
Assim caso você sofra um aumento incomum da sua mensalidade do plano de saúde consulte um advogado para que analise se o reajuste aplicado não é abusivo e ilegal.
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