Um julgamento no STF e o sinal de alerta aos proprietários de imóveis comerciais
Graças aos julgamentos do “Mensalão” e da “Lava-Jato”, habituamo-nos a associar o Supremo Tribunal Federal às polêmicas que envolvem os políticos e grandes empreiteiros.
Porém, os ministros do Supremo Tribunal Federal também julgam muitos assuntos que podem nos afetar diretamente.
Um exemplo que ilustra bem esta afirmação é o julgamento, realizado em 14.06.2018, que afasta a impenhorabilidade de bem de família do fiador na locação comercial.
Simplificando: O locador “A” alugou seu imóvel para a inquilino “B”, que por sua vez, apresentou como fiador a pessoa “C”.
Quando o contrato foi firmado e se iniciou o negócio, o locador “A” se sentiu muito seguro, pois sabia que, se o inquilino “B” não pagasse, o imóvel do fiador “C” seria “leiloado” para garantir a dívida, e pouco importava para o locador “A” se o imóvel do fiador “C” era bem de família (seu único imóvel), ou não, afinal, a Lei diz que em caso de locação, ainda que o imóvel seja um bem de família, o fiador perderá seu imóvel em caso de calote do inquilino.
E foi o que aconteceu: o inquilino “B” não pagou o aluguel, o locador “A” acionou judicialmente o fiador “C”, e seu único imóvel foi arrematado em um “leilão” para pagamento da dívida não honrada.
Tudo certo para o locador “A”, não é mesmo?
Pois, é aqui que entra a decisão do Supremo Tribunal Federal e que mudou a sorte de todos os envolvidos no negócio: Os ministros entenderam que o direito à moradia se encontra acima da livre iniciativa e do fato do fiador, voluntariamente, ter oferecido seu único imóvel como garantia.
O locador “A” foi penalizado com uma mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal e nada receberá, pois a única garantia de que dispunha era o bem imóvel do fiador, o qual, por sua vez, tem apenas um único imóvel, que guarnece sua família, e portanto, este imóvel é impenhorável.
Os ministros tomaram o cuidado de ressalvar que este entendimento não é aplicável a locação de imóveis residenciais, mas, isto não diminuiu o tamanho do impacto nos contratos de imóveis residenciais.
Assim, para os locadores de imóveis comerciais e para as imobiliárias, recomendamos uma radical mudança de procedimento: precisarão, a partir de agora, exigir fiadores proprietários de, no mínimo, dois imóveis.
E para as locações que se encontram em andamento, recomendamos que os inquilinos sejam solicitados a aumentar a garantia, oferecendo fiador proprietário de dois imóveis ou mais.
Reconheço que não será nada fácil, mas lembro que é melhor encarar esta dificuldade neste momento, a correr o risco de nada receber, no futuro, pela locação de seu imóvel comercial.
E, a propósito desta repentina e radical mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal, lembro também o maestro Tom Jobim, que já nos advertia, faz tempo, de que “o Brasil não é um país para principiantes”.
Fonte: Supremo Tribunal Federal, processo RE 605709. |
Ismael Cristo é advogado em São Paulo, Mestre em Direito pela PUC/SP e professor de Direito em programas de Graduação e Pós Graduação.
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