DIA INTERNACIONAL DAS MULHERES – direitos adquiridos, não aplicados e almejados
O artigo de hoje do escritório Cristo Constantino é uma homenagem ao dia internacional das mulheres, comemorado em 08 de março. Versa sobre os direitos alcançados e aqueles ainda não aplicados e os almejados pela comunidade feminina.
Nunca foi uma batalha justa, quem dirá igualitária. Em uma sociedade de cultura predominantemente patriarcal e machista, verdadeiras batalhas, no sentido literal da palavra, foram travadas a fim de alcançarmos os direitos das mulheres que temos hoje.
No Brasil, até 1927 as mulheres eram proibidas de frequentar a escola básica, e até 1979 as universidades. Até 1932 era proibido o voto feminino. Até 1934 não existiam direitos ligados a maternidade, e a demissão de mulheres ao ficarem grávidas era permitida. Até 1943 as mulheres casadas eram proibidas de trabalhar “fora” de casa se os maridos não autorizassem, conforme disciplinava o Código Civil de 1916. Não era previsto juridicamente o estupro entre cônjuges, e assassinato por honra era algo aceitável. Até 1960 não era comercializadas as pílulas anticoncepcionais, dificultando o relacionamento sexual das mulheres com outros parceiros e a livre escolha quanto ao seu corpo. Até 2006 não existia previsão legal para crimes de violência doméstica. Até 2015 não tinha lei reconhecendo como crime hediondo o assassinato de mulheres por razões da condição do sexo feminino.
Para que tais repressões acima descritas, de cunho exemplificativo, junto a outras inúmeras, pudessem ser superadas, foram necessários vários movimentos e acontecimentos marcantes historicamente, com grandes perdas não só patrimoniais, como também de saúde e de vidas, dentre as quais o trágico incêndio na fábrica têxtil de Nova York, em 1911, onde cento e trinta operárias morreram carbonizadas.
Hoje, contamos com previsões legais que asseguram o direito da mulher de estudar; votar e ser votada; trabalhistas; de herança; guarda; divórcio; direitos contra a violência doméstica; controle de natalidade; entre outros.
Entretanto, a tradição histórica de desigualdade de gênero, infelizmente, ainda persiste. Em que pese a Constituição Federal do Brasil tenha garantido o sufrágio universal às mulheres desde 1932, constatou-se que elas representavam apenas 15% do Congresso Nacional em 2019, de acordo matéria da UOL, ou seja, a participação e consequentemente os eleitos a cargos públicos na política são majoritariamente masculinos.
Nesse jaez também, desde 1919 a OIT (Organização Internacional do Trabalho) aprovou uma resolução que exige salários iguais para homens e mulheres na mesma função, mas até hoje a remuneração das mulheres, no Brasil, equivale a média de 76% da dos homens, na mesma função, segundo Estudo de Estatística de Gênero do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o que reprime o empoderamento e autonomia econômica feminina, ao lado menor proporção de promoções, menores posições de liderança corporativa e preterimento à contratação/admissão de homens tendo em vista a possibilidade de maternidade da mulher.
No que tange a seara educacional, ainda que o acesso tenha sido permitido, bem como a emancipação dos maridos, as mulheres ainda são as mais escolhidas entre o casal, para permaneceram nos lares, sem trabalhar “fora”. Isso porque é um costume enraizado na sociedade, de modo a ainda sofrer uma sobrecarga muito maior, quando não é exclusiva, de trabalho doméstico. Nove em cada dez mulheres são responsáveis pelos afazeres como de limpeza, organização, educação, alimentação e transporte dos filhos e animais.
Na homenagem do Tribunal de Justiça de São Paulo neste ano, há informação de que na Magistratura desde 1981 até hoje, a presença feminina representa 35%, de modo que é necessária que a data seja lembrada também pela reafirmação do compromisso com a busca pela igualdade de gêneros.
Ademais, a luta pelo fim da violência contra as mulheres também precisa continuar, já que mesmo diante das significativas evoluções legislativas, em especial com a aclamada Lei Maria da Penha de 2006, os mecanismos de prevenção/combate são frágeis. O Brasil registra um caso de agressão a mulher a cada quatro minutos, mostra levantamento do Ministério da Saúde. Em 2019 foram registrados mais de cinto e quarenta e cinco mil casos de violência, em que se lê, a de todos os tipos: física, sexual, psicológica e de outros tipos, igualmente danosas.
Importante notar que a violência, no mais das vezes, se dá na própria casa da vítima mulher, com agressor conhecido, e que diante do medo de retaliação ou impunidade, apenas 22,1% delas recorrem a polícia. Além disso, o índice é maior para a comunidade feminina que integra a população economicamente ativa (52%), ao revés daquelas que não compõe o mercado de trabalho (24,9), segundo estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), ou seja, quanto mais evoluída/instruída, mais propensa a sofrer violência a mulher se torna.
Uma considerável alteração legislativa recente foi o advento da Lei do Feminicídio, colocando o assassinato de mulheres por razões da condição do sexo feminino como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e compõe o rol de crimes hediondos, que devem ser tratados com maior rigor.
Isso sem contar o grande julgamento que se faz a mulher por conta da sua imagem. Desde os primórdios existem biotipos de corpo padrão na sociedade, em que nós mulheres somos aprisionadas, dentre as quais muitas desenvolvem doenças tentando se enquadrar, quando não perdem a própria vida na busca infinita. O tipo de vestimenta não rara as vezes se torna justificativa para atitudes machistas e sem respeito ao ser-humano em geral. Como se expressar, dançar, cantar, orar, criar seus filhos, amamentar, e até mesmo a cor da pele, também geram críticas que reprimem as mulheres.
Não poderia deixar de incluir as/os transexuais e afins, que apesar de nascidos com o sexo masculino, possuem a alma feminina. É indiscutível a grande rejeição da sociedade a essa pessoa, que faz parte de duas, quando não mais, minorias. Em reportagem exibida pela Globo, no Fantástico, neste mês de maio de 2020, o doutor Drauzio Varella fez uma matéria sobre transexuais nos presídios e fora deles, em que mostra uma triste realidade discriminatória, abusiva, e sem amor e respeito ao próximo.
Ponto essencial é que desde a criação no círculo familiar tenha a desassociação dos universos culturalmente atribuídos a cada gênero, como profissões, atividades físicas, comportamento, vestimenta e atividades domésticas. Corroborada com o ensino escolar, incentivando debate sobre conceitos, inclusive os que precisam se adequar a realidade atual da sociedade, enfatizar a necessidade de convívio regado a respeito, aceitação e afeto. Sem prejuízo do apoio do poder público com iniciativas destinadas ao mesmo fim, já que o Estado de Direito engloba duas noções de igualdade: a formal, em que é suficiente a regulamentação dos direitos pela lei, e a material, em que o Estado deve promover efetivamente a igualdade por meio de políticas e leis que considerem as necessidades particulares dos grupos menos favorecidos.
Os dados confirmam, ainda serão necessários mais de dois séculos para haver igualdade entre os gêneros no trabalho. Em outras áreas como educação, saúde, política, as disparidades entre homens e mulheres precisarão de cento e oito anos para chegarem ao fim, nos moldes da projeção feita pelo Fórum Econômico Mundial no fim de 2018. Ou seja, há um longo caminho a ser percorrido em busca de oportunidades dignas e tratamento justo entre os gêneros, então o dia 8 de março que foi oficializado pela ONU (Organização das Nações Unidas) na década de 1970 deve ser visto como um lembrete todos os anos, para continuarmos buscando por avanços na igualdade e justiça, para todas as áreas da vida humana!
“Livia Maria Rodrigues Cruz – pós-graduada em direito do trabalho e processo do trabalho e advogada no escritório Cristo Constantino e Advogados Associados”.
BIBLIOGRAFIA
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2020/03/condicao-feminina-no-universo-do-trabalho.shtml
https://novaescola.org.br/conteudo/16047/as-principais-conquistas-das-mulheres-na-historia
https://noticias.uol.com.br/politica/eleicoes/2018/noticias/2018/10/08/mulheres-sao-15-do-novo-congresso-mas-indice-ainda-e-baixo.htm
https://revistacrescer.globo.com/Familia/Maes-e-Trabalho/noticia/2016/02/ibge-mulheres-trabalham-cada-vez-mais-dentro-de-casa.html
https://tribunaonline.com.br/mulheres-trabalham-fora-e-cuidam-mais-das-tarefas-de-casa-diz-ibge
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=34977
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/09/brasil-registra-1-caso-de-agressao-a-mulher-a-cada-4-minutos-mostra-levantamento.shtml
http://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia?codigoNoticia=60537
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